quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Piano: me amarrar em você...



meus dedos e laços e braços e traços: anzóis
 
 
Notas perdidas,
permitidas
e dadas:
amadas.
dedo a dedo
pé a pé
compasso interminável:
sem barras o sol se prolonga...
pausa
eu mi bemol
e ritornello.
calma calma... que a vida não tem pressa


a gente que acelera

e se afoga... se afoga...

nada !

 
 
...
 
 
nada: o vácuo é o explendor do ser.

sábado, 8 de outubro de 2011

De pés descalços


Talvez se fizesse se sentiria livre por completo. Pois de meio em meio, as roupas se foram. Mas os pés, esses continuavam sufocados e cansados. Dentro de um sufoco que era transmitido para todo o corpo, em uma energia vertical, que ia para cima, e voltava para baixo. O ciclo não podia se concretizar, os sapatos barravam.
Mas demorara muito a reconhecer. Isso parece óbvio para você, pois agora eu já te contei que não se podem adentrar mundos de sapatos. Mas ninguém havia contado a ela. Ela era ignorante a isso. Ignorante a qualquer liberdade. Nem conhecia sensação.
Era quase um erro: tirar os sapatos. Encarar os pés, reconhecê-los, deixá-los fazer qualquer coisa não presa. Era por partes. Pois ainda não havia tirado os sapatos.
Foi quando ela sacudiu os pés, movimentos rápidos, como se fosse proibido, sacudindo, com pressa, com raiva, decidida, então os sapatos se foram, então descansou.
Sentiu o chão gelado: era uma realidade que a jogava para cima, promissora. E podia, sentindo o chão, voar.  
Era como pousar em uma brisa. Era mais que isso: voar de pé no chão. E só foi possível graças aos sapatos tirados. E ela que já andava sem roupas pela vida, ainda não havia sentido tal leveza. Era seminua. Na verdade, era nada nua. Uma nudez experimental; que não se concretizava nunca. Ou não se abstraia. Era algo como que não voasse; como que não fosse; como que mentira. Incompletude.
Achava certo sair por ai de sapatos. Talvez por achar que os pés são partes menos importantes. Como os pés podem ser desimportantes para alguém que não tem asas?
Ia passar a vida à procura das tais asas para alcançar vôo. Ela que não sabia que para voar não precisa de asas. Não sabia que voar não precisa de ter, precisa é ser.