segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

agonia


cama vazia
rumo agudo
o que me restaria
nesse tudo desnudo
é o criado,
mudo.

como se fosse um pássaro
você veio assim
voando, voando pousou
e botou amor em mim

e eu vindo
infindo o findo
isso é lindo

Além-mundo


seco o mundo
eu seco
soco tudo

seco o profundo
eu seco e oriundo
soco o mundo

e num segundo
eu fecundo
aquele submundo

sábado, 14 de janeiro de 2012

fim de ano


Acaba-se o ano,
acaba-se a glória
e tudo que me resta por ora
é recontar a história.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Reverso (a)


Uma bela resposta, mais belo ainda o presente: para ler com o texto Avessa (o).


Resolvi que aquela noite seria diferente: tentaria ignorar o fluxo contínuo de pensamentos que nunca me deixavam em paz. Saí de casa antes do anoitecer disposta enfrentar algo fora de mim mesma.
Os sons de carros e motos eram realmente assustadores, afinal, estava acostumada a lidar com meus silêncios interiores. Como se isso não bastasse, risadas e conversas chegavam até mim e penetravam meu interior como facas. Todo aquele barulho afirmava o mundo a meu redor, lembrando-me constantemente de que não adiantava fugir. Talvez fosse covardia, mas fato era que lidar com meus próprios conflitos já era difícil de mais. Mesmo que a vontade de pessoas fosse grande, ter a mim mesma era muito mais forte, era conforto.
Porém não era conforto que eu buscava agora, caso contrário não teria saído de casa. Abri os braços e respirei fundo para que entrasse todo cheiro ocre da poluição. Até no ar a presença humana se fazia presente, inseparável. Devagar fui movendo os braços para frente, saindo de mim, abarcando o mundo em minha volta... Até que me deparei com algo. Envolvi-o. O calor de alguém me aquecia, dois corpos se faziam em um, comprimindo-se com força, ligando externos. Que fosse o abraço de um desconhecido ou apenas meus próprios braços que haviam contornado o corpo, não importava.
Só sei que quando criei coragem para abrir os olhos, não havia mais abraço. Apenas o sol se pondo atrás de um prédio. Recomecei a andar, era hora de partir, assim como os raios de luz já o faziam. Caminhava devagar, meu corpo se preparando para a vida, enquanto a noite chegava corajosa, impondo sua presença. Estava um pouco nervosa, era a primeira vez que agia dessa maneira, mas achei interessante a expectativa da fragilidade e segui em frente.
De repente eu entrei. Assim, sem pensar. Abri a porta devagar e vi o corpo dela sobre a cama, delineado pela luz fraca que entrava pela janela. Era estranho para mim ir de encontro a alguém assim. Podia fingir que sabia lidar com aquilo, mas a verdade é que estava medo.
Eu torcia para que o tempo corresse e eu pudesse acabar logo com aquilo, mas ele insistia em demorar a passar. Ela foi fechando os olhos à medida em que eu me aproximava, e permaneceu imóvel. Em nenhum momento parei para pensar sobre o que faria; era necessário apenas agir, seguir o fluxo e não parar. A pessoa que adentrou aquele quarto definitivamente não era a mesma que saiu de casa. Algo nasceu em mim naquela noite.
Não posso dizer que foi um parto sem dor. Mas não desisti, era necessário que fosse assim, que eu não planejasse, que eu não tivesse controle sobre minhas sensações. E que eu causasse sensações alheias. Era hora de me preocupar com o outro e deixar surgir em mim tudo que fosse necessário.
Enquanto caminhava pelo quarto, ouvia suas gargalhadas na cama e isso me encorajava. Em algum momento me livrei das roupas, queria parecer vulnerável, explícita. Ao mesmo tempo precisava mostrar que era capaz de estabelecer contato, que eu sentia, que eu desejava. Sentei ao lado dela segurando suas mãos entre as minhas como quem pede confiança, e prossegui. Queria transmitir para alguém toda a paz que eu gostaria de ter naquele momento. Não era necessário falar, apenas agir, não interromper, cada vez mais rápido, contínuo, intenso!
Sem perguntar a ninguém, o riso tomou conta do quarto. Gargalhávamos alto, juntas. Éramos nós, eu, a outra e aquela. Revertendo momentos presentes. Reinventando o tempo.
Em algum momento o silêncio surgiu, e pouco depois ela fechou os olhos. Eu parti, exausta. Acordei sem ninguém ao meu lado. Mas não estava mais sozinha, o fluxo contínuo de pensamentos agora se dividia na minha cabeça. O que quer que tenha nascido naquela noite, estava ali comigo, me habitando, morando em meu próprio corpo. Assustada, me dei conta de que para estar só seria necessário algo mais que me manter entre quatro paredes. Por um bom tempo, mesmo sem sair de casa, eu teria companhia.

Olga Penna.